Livre, feliz e onde quiser

Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil
Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil

A conectividade da internet e a possibilidade que cada um de nós temos hoje de brincar de opinion-makers representam uma faca de dois gumes. Ao mesmo tempo em que a apuração, qualidade da informação e uma visão crítica aguçada caem imensuravelmente de nível, conseguimos nos mobilizar para grandes feitos e nos posicionar a favor ou contra os movimentos do nosso país. A hashtag #belarecatadaedolar é mais um exemplo maravilhoso de como as mulheres estão se unindo e se tornando uma força que só caminha para frente. Não há mais como voltar. Depois do #meuamigosecreto, #meuprimeiroassedio, e de as mulheres estarem de fato tomando as ruas, fica nítido que o caminho contra o patriarcado será duro, mas que ele está robusto. Acredito que a “primavera feminista” só vai florescer.

Marcela Temer, retratada de forma estereotipada, irônica e, por que não dizer, ridícula, é mais um exemplo da falência extrema dos grandes veículos de comunicação brasileiros – mas, por outro lado, da ascensão de veículos alternativos, que ganham voz em redes sociais, por meio de análises mais críticas e que hoje ganham voz e credibilidade. Acredito que a própria Marcela deve estar com vergonha da forma como ela foi exposta na VEJA.

A mulher pode aspirar e deve ter o direito de conseguir ser o que ela quiser. Se ela achar melhor usar saias até o joelho, estudar e não exercer a profissão, isso deve ser respeitado, contanto que seja uma escolha consciente, e que a mulher saiba de seus privilégios e barreiras nesta dinâmica. Porque, sim, é muito mais fácil ficar em casa do que dar a cara a tapa nesse mundão. Por isso, a consciência e o despertar são fundamentais: para entender se há alguma imposição ou se, de fato, não há vontade de se buscar alternativas de vida.

Mas este é o ponto: esta consciência só é possível quando se reconhece o privilégio do homem na sociedade em que vivemos. Alcançar esse entendimento não é imediato, já que homens e mulheres e as dinâmicas em nossa volta nos fazem acreditar que não há machismo, que isso é “coisa da nossa cabeça”, que não existem injustiças, e que de fato não é preciso mais o movimento feminista, já que a igualdade de gênero foi alcançada. Precisamos cada vez mais questionar as figuras masculinas e femininas a nossa volta, trazê-las para o nosso entendimento, dar exemplos de vezes em que fomos barradas, abusadas, negligenciadas. Nós não somos loucas.

Há mulheres que dizem que essa luta é somente das mulheres, que os homens não devem fazer parte. Há mulheres que dizem que devemos, sim, incluir os homens, senão não haverá alcance. De qualquer forma, é preciso praticar a empatia, entre nós mulheres, acima de tudo, dentre os diversos movimentos feministas e as diferentes origens sociais e visões de mundo. Há um ponto convergente aí, que eu vejo se expressando nas redes sociais principalmente, que é este: podemos ser o que quisermos ser, basta entendermos as dinâmicas de gênero e não deixarmos de nos posicionar. Nos ajudarmos, alertarmos umas às outras.

Nossas mães e avós, as feministas que lutaram para que nós hoje possamos postar essas fotos no Facebook, possamos votar, possamos nos divorciar, possamos denunciar, possamos alcançar espaços de representatividade. A partir dessas conquistas, precisamos ir além pois os números ainda são alarmantes, a injustiça de gênero está instaurada nas mentes e em nossas rotinas.

Por isso, vamos continuar postando, inundando o Facebook, gritando (por mais que digam que nossas vozes são esganiçadas, “voz de mulherzinha”), nos capacitando, estudando, nos organizando, e nos unindo, para continuar nessa caminhada. Até que a liberdade seja de fato genuína, até que alcancemos nossos direitos e que não precisemos ser retratadas de um jeito ou de outro, sem acreditar que a sorte está no homem. A sorte está em poder sermos quem quisermos.

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
leticia-born

Jornalista e mestre em Desenvolvimento Internacional, Leticia já trabalhou com comunicação, direitos da infância e responsabilidade social. Após uma temporada em Amsterdã e Amã (Jordânia), voltou engajada por discutir questões de gênero e feminismo(s).

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